Antes de qualquer outra coisa importa clarificar o que é um microbioma, depois clarificar o que é o microbioma do recém-nascido.
O microbioma humano é a coleção do genoma de todos os microbiotas (composto por bactérias, ácaros, fungos, protozoários e vírus) que vivem no corpo humano, ou, por outras palavras, é o património genético dos micro-organismos que vivem com o ser humano e que residem em diversos sistemas do corpo, como o aparelho respiratório ao gastrointestinal, da pele ao aparelho geniturinário.
No homem existem dez vezes mais células microbianas do que células humanas e, estima-se mesmo que entre a superfície interna e externa do corpo humano existam cerca de 100 triliões de microrganismos. Estas células encontram-se, predominantemente, no intestino, exercendo uma grande influência nos mecanismos de homeostase, desempenhando funções essenciais na digestão, metabolismo dos alimentos, desenvolvimento, ativação do sistema imunológico e produção de neurotransmissores que afetam o comportamento e a função cognitiva.
Também de acordo com a zona do corpo, o microbioma vai-se alterando, por exemplo nas zonas mais quentes e com maior nível de humidade existe uma maior concentração de microrganismos comparativamente às zonas com nível de humidade mais baixo.
A relação entre o parto e o microbioma
Não é segredo que o nosso primeiro contacto com o mundo real se dá no ato do parto, seguido das mãos de quem nos puxa. Como tal não causará qualquer tipo de estranheza afirmar que o tipo de parto pode contribuir para diferenças no microbioma do recém-nascido, certo? Diferenças essas que, por si, levam a variações na fisiologia normal e à predisposição para o aparecimento de determinadas patologias.
Bebés que nascem por parto vaginal apresentam um microbioma predominantemente influenciado pelo microbioma vaginal materno (como Lactobacillus, Prevotella e Sneathia). Já os bebés nascidos por cesariana, apresentam um microbioma menos diversificado composto por comunidades bacterianas semelhantes às encontrados no bloco operatório, cavidade oral e pele (como Staphyloccus, Corynebacterium e Propionebacterium). Existem mesmo evidências que sugerem que, aproximadamente, 64 a 82% de todos os casos relatados de infeções por Staphylococcus aureus (MRSA) ocorrem em bebés nascidos por cesariana. Algo que pode ser explicado pelo facto destes, não terem sido expostos às bactérias protetoras presentes no canal vaginal.
Tendo em consideração que a maior colonização do recém-nascido ocorre durante o nascimento, é então essencial que os profissionais estejam sensibilizados para os fatores que podem alterar a composição do microbioma.
Intervenções que podem influenciar o microbioma do recém-nascido
Não recomendado por rotina
- Cervicometria (toque vaginal)
- Monitorização fetal interna
- Cateterização vesical (algaliação ou esvaziamento vesical com sonda)
- Administração de antibióticos
- Utilização de antissépticos na desinfeção e cuidados perineais no parto
Recomendado
- Promoção do parto normal
- Aleitamento materno precoce
- Contacto pele a pele durante a primeira hora de vida
- Primeiro banho do recém-nascido idealmente após as 24horas de vida
No caso de ser necessário realizar cesariana:
- Colonização do recém-nascido com compressa colocada no canal vaginal materno (1hora antes da cesariana):
- Material necessário: 1 copo esterilizado, 2 compressas esterilizadas tamanho 10 / 10 cm, 1 ampola de soro fisiológico 10 ml.
6. Retirar antes da cirurgia começar
7. Colocar num recipiente estéril (p.e. copo de colheita de urina)
8. Manter à temperatura ambiente.
9. No primeiro minuto após o parto passar no corpo do recém-nascido pela seguinte ordem: lábios, face, tórax, braços, pernas, genitais, ânus e costas.
Em suma, o desenvolvimento do microbioma começa no útero. No entanto, aspetos relacionados com o trabalho de parto e parto, têm-se mostrado determinantes para a colonização do recém-nascido.
A transferência do microbiota materno serve como proteção inicial, com implicações na saúde do recém-nascido a longo prazo, havendo estudos que referem a existência de diferenças no perfil do microbioma dos bebés nascidos de parto vaginal comparativamente aos nascidos por cesariana.
No caso da cesariana, esta aumenta a suscetibilidade para o aparecimento de asma, alergias, diabetes, obesidade, patologias reumatológicas, gastrointestinais e do sistema nervoso central (Yang et al, 2016).
Andreia Ferreira (Enfermeira)
Cristina Nascimento (Enfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia)